A aventura de viver longe da família e dos amigos não atraía muito nossas crianças. O plano de passar um ano na França veio de adultos que nunca moraram no exterior, mas os filhos rejeitaram essa ideia desde que ela surgiu pela primeira vez. "Não quero ir", dizia a Ana. Frente a um pouco mais de insistência, ela respondia: "vamos passar um mês; um ano é muito".

O único argumento que conseguiu animá-la foi: você vai conhecer a neve. Um natal com neve parecia algo mágico para uma criança dos trópicos, e a realização desse sonho passou a ser o principal estímulo para que a viagem fosse vista com algum nível de interesse. O compromisso de levar Ana e Mathias para conhecer a neve se tornou, então, um dos elementos centrais de nossa aventura.

Para evitar a frustração de não conseguirmos ver a neve no natal, planejamos há meses que o recesso de fim de ano seria passado nos lugares mais frios da França, onde alguma neve parecia inevitável. Subiríamos os Alpes franceses em Grenoble, atravessaríamos a Suíça e visitaríamos alguns dos mercados de natal mais famosos da França e da Alemanha, em Colmar e Freiburg.

Para completar, quis levar as crianças para passar a noite de natal em um hotel que fica em um convento, no alto de uma montanha dos Vosges, no meio de uma floresta de pinheiros, onde vi neve caindo pela primeira vez, ainda no milênio passado. Quando passei o natal no Mont Sainte Odile, fiquei impressionado pela imagem dos peregrinos que subiam o monte nevado para assistir à missa de natal, na noite do dia 24.

Se era previsível haver neve em algum lugar, seria ali. O plano, inclusive, era levar as crianças para passar a véspera de natal na estação de esqui de Champ du Feu, que fica a menos de 10 km do hotel. Até uma semana antes do natal, preocupava-nos a possibilidade de um excesso de neve, que dificultasse o acesso para motoristas que não têm o menor treino em conduzir sobre pistas congeladas. Naquele momento, a cidade mais fria da França era Strassburg, a 50 minutos do Mont Sainte Odile, onde estava fazendo uma mínima de 15 graus negativos. Houve uma noite em que caíram 30 cm de neve nessa região, atrapalhando o trânsito e os voos.

Nossa falta de preparação para o frio nos levou a voltar à Decatlhon e comprar ainda mais agasalhos, segundas peles e botas para enfrentar frios congelantes. As roupas são essas que estamos usando, mas o frio não correspondeu. Quando começamos nossa viagem, as temperaturas começaram a subir.

Em Aix, já estávamos acostumados com temperaturas de 5 graus positivos e, a princípio, ficamos felizes com a perspectiva de viajar em temperaturas próximas a 10 graus. Tínhamos receio de enfrentar temperaturas congelantes em áreas com muita chuva e umidade, uma vez que Grenoble é a cidade francesa com maior número de dias chuvosos por ano. Mas chegamos lá no dia da final da Copa do Mundo, e assistimos à França perder para a Argentina sob um céu azul e uma temperatura amena.

Aqui, os jornais diziam que a temperatura estava "douce". Essa doçura do clima colocava em risco todas as atividades das estações de inverno, pois enfrentávamos temperaturas em que as precipitações todas caem em forma de chuva, e não de neve, a menos que se esteja a mais de 2.500 metros de altitude.

Acabamos conseguindo chegar à neve, mas precisamos subir no alto de uma montanha, onde visitamos a linda estação de Chamrousse, que fica no alto dessa montanha, vista a partir da cidade.

Subimos essa estradinha cortada no morro, até chegar à base da estação de esqui, que fica mais à direita. Não chegamos ao alto do morro, pois seria necessário usar o teleférico, que não tivemos tempo de pegar.

Quando estávamos no meio do caminho, encontramos um campo nevado e paramos para as crianças brincarem, o que gerou as fotos da descoberta e das primeiras guerras de bolas de neve.

Mas este foi um momento ímpar, não só pela desoberta, como pelo fato de que o dia estava relativamente quente. Era a neve, com o céu aberto e sem nuvens e com um tempo relativamente ameno. Estava gelado, mas não estava agressivamente congelante. Porém, era um clima em que a neve derrete aos poucos, o que fez com que nós não a encontrássemos mais em nossos caminhos pela Alsácia.

Subindo mais um pouco (ou nem tão pouco), chegamos à estação de esqui propriamente dita. Eu me senti em marte, pois era um peixe completamente fora d'água. Os locais usavam aquelas roupas coloridas, carregavam seus esquis e seus bastões e desciam a toda velocidade as pistas. Eu nem sabia por onde começar a me adaptar a esse mundo estranho, que eu também não conhecia. A Letícia já tinha ido a Bariloche no inverno, mas eu nunca tinha visto uma estação assim e nunca coloquei um esqui no pé.

A Letícia logo encontrou uma aula de esqui, em que as crianças passaram uma hora aprendendo os fundamentos. Chegaram sem saber nada e já saíram deslizando um pouco. Com mais alguns dias de curso, eles aprenderão.

O único lado ruim foi que a Ana levou um tombo previsível e machucou o joelho, o que a fez mancar por alguns dias. Felizmente, isso aconteceu somente no final do dia. Mas o Mathias disse que foi um dos dias mais felizes que ele já teve e ambos querem muito poder voltar para as montanhas!

Pôr-do-sol em Chamrousse.